Friday 30 January 2015

Para os que dizem que a Grécia não fez qualquer esforço de ajustamento...

... e que andou a brincar com os credores, este quadro e este gráfico falam por si:


 
Fonte: Peterson Institute for International Economics

Thursday 29 January 2015

Grécia e União Europeia: Estratégias incompatíveis?

A vitória do Syriza na Grécia é a resposta dos cidadãos a uma agenda de quase cinco anos de austeridade sentida como injusta, excessiva e interminável.

É uma reacção com a qual muitos outros europeus se identificarão e que equivale ao meu "Basta!" de há dois anos a um processo de ajustamento que parece não levar a lado nenhum e que, pelo contrário, levou as pessoas a uma situação de angústia e desesperança.

Todas as críticas que fomos fazendo à troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) quer em termos de substância - a imposição de um ajustamento brutal num período de tempo demasiado curto, sem espaço para reajustar trajectórias e que, além disso, não produziu os resultados esperados - quer no que se refere à falta de controle político sobre as suas decisões, ficaram infelizmente bem ilustradas no caso grego.

Ainda em Dezembro último, com a eleição do presidente da república a agitar a agenda política, a troika recusou fechar o programa de ajuda externa da Grécia e libertar a última tranche dos empréstimos europeus, exigindo mais "reformas estruturais" e mais centenas de milhões de euros de ajustamento.

Quem responde pelas consequências políticas desta e de outras decisões da troika?

Impor sacrifícios adicionais a um país exausto que perdeu no processo de ajustamento mais de 25% da riqueza nacional, tem metade dos jovens no desemprego e se debate com um nível de pobreza brutal é insuportável.

Todo este processo empurrou politicamente o eleitorado para fora dos partidos moderados e pró-europeus que, à esquerda (o PASOK quase desapareceu) e à direita, tentaram ir interpretando e assumindo as recomendações da troika.

A primeira lição a tirar deste resultado é que ou a União Europeia dá aos partidos democráticos e pró-europeus a oportunidade de encontrarem as soluções necessárias, ou estaremos a empurrar a Europa para partidos extremistas e anti-europeus.

Em França e Itália, ao lado de Governos que parecem ser a última chance europeísta, são os partidos anti-euro que ganham todos os dias mais popularidade e peso.

Há aqui um grande risco mas também uma grande oportunidade. Apesar de não ser maioritário a nível europeu, o centro-esquerda tem vindo a conseguir alterar aos poucos a agenda europeia, sem quebrar mas "torcendo". É o caso da flexibilidade finalmente admitida no Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) ou do novo fundo europeu de investimento.

É preciso, ao nível europeu, dar espaço às alternativas - e elas existem! - de mudança e de reformas, sem os exageros patrocinados pela direita mas também sem os riscos brutais que os extremos anti-europeus protagonizam.

No caso grego, a grande questão do momento é saber se, uma vez chegados aqui, estamos ainda num ponto em que o diálogo é possível, mesmo que eventualmente musculado, ou se se tornou inviável. Esta segunda hipótese é preocupante! Não vejo nada de bom numa ruptura. Já não via em 2010-2011 e continuo a não ver.

Vejo em contrapartida que o Syriza chegou ao poder corporizando uma reacção de rejeição do processo de ajustamento por parte dos cidadãos mas, ao mesmo tempo, com uma agenda em que poderá estar a criar as condições para não negociar e romper.

Este risco resulta nomeadamente da sua aliança com um partido (Gregos Independentes) que não quer compromissos nem é europeísta e que tem uma atitude do tipo de "quanto pior melhor". Tsipras tinha outras alternativas, por exemplo o To Potami (centro esquerda, europeísta), mas não quis. O sinal que envia é de uma posição de negociação muito rígida ou mesmo de não negociação.

Estes sinais estão a gerar uma reacção quase epidérmica de endurecimento de posições por parte dos países da zona euro, em particular da Alemanha.

Espero que a França e Itália - e penso que François Hollande e Matteo Renzi se estão a posicionar para isso - dois grandes países que percebem melhor o diálogo entre o Norte e o Sul e são neste momento liderados por forças políticas de esquerda, possam fazer uma ponte, o que começa por um alargamento dos prazos de amortização da dívida grega e por um alívio rápido da austeridade.

Se não for possível fazer a ponte, temo que se avizinhem tempos muito complicados. Qualquer má avaliação do risco pode provocar um problema gravíssimo não só para a Grécia mas também a nível europeu e mesmo internacional.

Alguns sinais sugerem por outro lado que a Grécia poderá estar a fragilizar a já débil política externa da UE aproximando-se da Rússia e minando a estratégia dos europeus face à Ucrânia.

Igualmente preocupante é o facto de o Syriza não parecer minimamente disponível para aplicar aquelas componentes das políticas de ajustamento que faziam sentido, e que estavam negociadas com a troika. Algumas das opções políticas já assumidas, como o aumento em 30% do salário mínimo de um dia para o outro ou os recuos aparentes em passos que já tinham sido dados, nomeadamente na reforma da administração pública, são de sustentabilidade duvidosa e agravam seriamente o risco de incumprimento do défice e da dívida, inviabilizando as negociações com a União.

Do lado dos países dominantes da UE, por seu lado, há um recurso sistemático à crítica quase caricatural da Grécia, o que também não ajuda. Já tivemos caricaturas que chegassem. Humilhar cidadãos desesperados que não têm culpa directa de problemas relativos à desorganização do Estado ou do sistema de cobrança de impostos é contraproducente e desumano.

É lamentável que depois do enorme esforço que os gregos efectivamente fizeram, se chegue ao fim a fazer exactamente as mesmas críticas que se faziam no início do processo de ajustamento.

Pelos vistos, as tais reformas estruturais impostas pela troika incidiram em tudo menos no que era necessário e não atingiram objectivos fundamentais, como a organização da máquina administrativa.

Tudo isto ilustra bem um dos argumentos centrais do relatório que fizemos no Parlamento Europeu há um ano sobre a troika e sobre a necessidade de lhe pôr fim: a troika não demonstrou capacidade para fazer programas de ajustamento eficazes nem confiáveis, com a agravante de que a ausência de legitimidade política e controle democrático das suas decisões a torna perigosamente inimputável.

Que saída?

Neste momento o mais urgente é perceber exactamente o que é que o novo Governo grego vai propor à UE. Há muitos pontos na sua agenda que fazem todo o sentido, mas a questão é saber se a agenda é aquela que conhecemos ou se esta é apenas a ponta do iceberg. Faz sentido colocar na agenda europeia a questão de uma conferência de dívida - em que os credores possam debater abertamente as condições do reembolso, incluindo a possibilidade de um reescalonamento,  períodos de carência, ou até a eventualidade de um perdão parcial.

Este é um debate que faz todo o sentido, como faz todo o sentido abrandar o ritmo do ajustamento utilizando a flexibilidade do Pacto de Estabilidade, como nos fartámos de propor.

Há muitas propostas do Syriza que fazem sentido. Mas ao entrar numa aliança com um partido eurocéptico, ao decidir um aumento imediato e brutal das despesas públicas, e ao aparentemente abrir uma brecha na política externa europeia face à Rússia, Tsipras está a dar sinais de que talvez a sua agenda seja muito mais complicada do que aquela que conhecíamos, e que nos parecia gerível.

Monday 26 January 2015

O PEC não mudou, e, no entanto, moveu-se

A recente interpretação do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) operada pela Comissão Europeia ainda não é a grande viragem pela qual os socialistas se batem há anos, mas é o primeiro passo na direcção certa pelo facto de reconhecer alguns dos elementos de flexibilidade que, apesar de terem sido introduzidos nos textos legislativos, nunca foram realmente aplicados.

Durante vários anos, o debate na União Europeia (UE) em matéria de equilíbrio das finanças públicas dividiu profundamente a direita e a esquerda. Não sobre a necessidade de os seus Estados em geral e os membros do euro em particular manterem contas equilibradas: ao contrário do que certa direita quer fazer crer, os socialistas nunca foram contra a consolidação das contas públicas. O que nos divide e aí, sim, profundamente, é o modo de o fazer.

Para alguma dessa direita, a simples correcção dos défices orçamentais é só por si suficiente para criar as condições para o regresso do crescimento económico. Se dúvidas houvesse, a realidade dos últimos anos desmente bem essa crença: a média dos défices dos países da zona euro desceu de 6,1 % do PIB em 2010 para 2,6% em 2014, mas o crescimento económico permanece anémico. Pior: a Europa está em risco de entrar num longo período de estagnação e é aliás a única zona do mundo que permanece em crise mais de 6 anos depois do colapso do banco Lehman Brothers.

Um ajustamento centrado apenas na redução acelerada do défice que não seja acompanhado de um robustecimento das bases em que assenta a competitividade da economia, não gerará mais do que uma convergência meramente nominal, conjuntural e sem sustentabilidade.

É por isso que o debate tem de abandonar a dicotomia primária do consolidar ou não as contas, para incidir sobre o ritmo, dimensão e componentes do ajustamento na trajectória de consolidação. De pouco serve uma consolidação que deixa os estados com o tecido económico e social completamente destruído.

Esta é a nossa crítica fundamental à abordagem que tem sido seguida nos últimos anos na Europa.

Hoje é amplamente reconhecido que o ajustamento imposto pela anterior Comissão Europeia de Durão Barroso e Olli Rehn, apoiada pela maioria conservadora do Conselho Europeu, foi excessivamente rápido e brutal, com a agravante de ter sido reforçado por estranhas concepções moralistas que dividiram os países em virtuosos (os credores) e pecadores (os devedores), sofrendo os últimos, como parte do processo de ajustamento, uma supostamente merecida punição.

Na revisão do PEC que teve lugar entre 2011 e 2013, a esquerda no PE conseguiu introduzir nos textos legislativos (conhecidos por Six Pack e Two Pack) margens de flexibilidade - leia-se de racionalidade económica - para garantir, entre outros aspectos, que os ritmos de ajustamento impostos aos países em défice orçamental excessivo pudessem ser ajustados à sua situação económica específica.

A anterior equipa da Comissão Europeia optou por não reconhecer nem utilizar estas margens de flexibilidade. Paradoxalmente, e perante o incumprimento das metas de ajustamento por parte de diversos países, essa mesma Comissão não teve alternativa senão ir alterando essas metas e /ou os correspondentes prazos, embora o tenha feito de forma muito pouco transparente e sob a capa de grandes concessões políticas, recusando assumir aquilo que de facto era: a aplicação pura e simples da legislação na sua totalidade.

A nova Comissão de Jean-Claude Juncker decidiu finalmente fazer agora o que a sua antecessora sempre recusou: usar as margens de flexibilidade contidas no PEC.

Para esta mudança contribuiu a visão democrata-cristã e, consequentemente, mais social, do novo presidente, o facto de Olli Rehn ter sido substituído por um comissário socialista, Pierre Moscovici, e a pressão da Itália, país que, apesar de ser a terceira economia da zona euro, se debate com muitos dos problemas típicos dos parceiros da periferia.

As regras do PEC foram agora interpretadas numa comunicação da Comissão: o ritmo do ajustamento deixa de ser uma trajectória cega passando a ser adaptado ao ciclo económico de cada país, o que é do mais elementar bom senso. Em situações económicas extremas, aliás, não será exigido qualquer ajustamento. Se esta flexibilidade tivesse sido aplicada em tempo útil, a recessão económica na Europa, e em Portugal, teria certamente sido bem menos severa.

O impacto orçamental das reformas estruturais potenciadoras de crescimento económico também não será contabilizado para efeitos do PEC - o que significa que mesmo que tais reformas provoquem uma alteração da trajectória fixada em termos de ajustamento orçamental, não implicarão uma obrigação de correcção imediata do desvio.

O investimento estratégico também beneficiará do mesmo tipo de tratamento e neste conceito inclui-se o investimento nacional em projectos financiados pelos fundos estruturais de apoio às regiões mais desfavorecidas da UE.

Infelizmente, este tipo de flexibilidade só se aplicará, por agora, aos países que não estão em situação de "défice excessivo" (superior a 3% do PIB), o que deixa por enquanto Portugal de fora. Alargar a flexibilidade a estes países será um dos nossos próximos combates.

A interpretação da flexibilidade operada pela Comissão Europeia ainda não é a reforma profunda que defendemos para transformar o PEC num instrumento inteligente de governação da zona euro. Mas é um primeiro pé que colocamos na porta para podermos, finalmente, começar a corrigir os erros do passado. Estas alterações "interpretativas", conjugadas com a iniciativa para o investimento Europeu (Fundo Juncker) e articuladas com as recentes decisões de Mario Draghi à frente do Banco Central Europeu, parecem estar finalmente a trazer um pouco do absolutamente necessário oxigénio à Europa... Já era tempo, mesmo se ainda está muito por fazer.

(Artigo publicado no Público de 25 de Janeiro de 2015)
 
 

Friday 23 January 2015

Reacção à decisão do BCE

Mario Draghi voltou a cumprir o que prometeu

Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu (BCE), voltou a provar esta semana que está à altura das circunstâncias e, sobretudo, da sua promessa de "fazer tudo o que for preciso" para salvar o euro.

O lançamento pelo BCE de um programa de compra de dívida dos Estados para injectar liquidez na economia europeia é totalmente justificado e Draghi tinha todas as razões, além de um mandato claro, para o fazer: a inflação na zona euro está virtualmente a zero e é mesmo negativa em vários países, o que significa que está muito longe do objectivo de 2% fixado pelo BCE.

Mesmo se era absolutamente necessário, este estímulo à economia não é todavia só por si suficiente para permitir ultrapassar a crise económica e social europeia e terá agora de ser complementado com uma política orçamental adequada.

Isto significa que o ajustamento das finanças públicas em que praticamente todos os países do euro estão empenhados terá de passar a ser bem mais inteligente do que até agora. A recente decisão da Comissão Europeia de aplicar, finalmente, as margens de flexibilidade que já estão previstas no Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) - largamente impostas pelo Parlamento Europeu e, em concreto, pelos socialistas - deverá permitir a definição de um ajustamento mais sensato tanto em termos de substância como de ritmo, dando simultaneamente mais espaço para os Estados realizarem reformas estruturais inteligentes.

A conjugação da decisão do BCE com a flexibilidade do PEC e com o novo fundo de investimento de Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, dá-nos alguma esperança de que a Europa consiga sair da estagnação económica e destruição sistemática de empregos em que permanece mergulhada há vários anos.

Para isso, todavia, é preciso que os Governos da União Europeia se associem a este movimento e se decidam, finalmente, a libertar os cidadãos do sofrimento de estarem a pagar, há tanto tempo, um preço exorbitante por uma situação que não criaram.

Wednesday 14 January 2015

Boa notícia para o programa do BCE de compra de dívida pública (OMT)

É uma excelente notícia para a zona euro: o novo programa de compra de dívida pública (OMT) por parte do Banco Central Europeu (BCE) para proteger os Estados membros de ataques especulativos, foi hoje considerado pelo advogado-geral do Tribunal de Justiça da União Europeia (UE) compatível com o direito comunitário.
Se esta opinião vier a ser confirmada, dentro de alguns meses, pelo Tribunal, dará razão ao presidente do BCE, Mario  Draghi, em detrimento da posição do Tribunal Constitucional Alemão e de uma série de críticos da política do BCE no mesmo país.
Esta posição deverá significar igualmente o fim das troikas, ou, pelo menos, o fim da participação do BCE nestas estruturas ao lado da Comissão Europeia e do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Este desfecho resulta da opinião do advogado-geral de que o BCE não deverá participar nos programas de assistência financeira dos países que venham eventualmente a beneficiar de OMT.
Recorde-se que o BCE impôs como condição à activação do seu programa de compra de dívida no mercado secundário dos países com problemas de liquidez que os beneficiários subscrevam um programa de assistência financeira.
A saída do BCE poderá permitir finalmente a abertura de um debate sobre o fim das troikas como é há muito pedido pelos socialistas e pelo Parlamento Europeu, e a transferência das suas funções, que têm consistido sobretudo na concepção e vigilância dos programas de assistência, para uma instituição da UE.
Até Olli Rehn, o ex-comissário europeu responsável pelas troikas, incluindo no programa de assistência a Portugal, já reconheceu que a opinião do advogado-geral poderá significar "o princípio do fim da troika na sua forma actual".
A ser assim, a concepção e vigilância dos programas de ajustamento deverá passar a ser uma competência exclusiva da Comissão Europeia, ficando todo este processo sujeito a um controlo político democrático e transparente, o que não é actualmente o caso por se tratar de uma instância intergovernamental, opaca e sem legitimidade democrática.

 

Tuesday 13 January 2015

Nova flexibilização do Pacto de Estabilidade e Crescimento poderia ter atenuado gravidade da recessão económica em Portugal

A possibilidade de algum tipo de investimento público poder ser descontado do cálculo do défice orçamental dos países do euro para efeitos do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) - que foi hoje finalmente aceite pela Comissão Europeia nomeadamente no quadro do seu novo fundo de investimento (EFSI) - vem ao encontro de uma velha reivindicação dos socialistas europeus.

Este primeiro passo para uma viragem da agenda económica destinada a relançar o investimento na Europa e evitar-lhe um longo período de estagnação, é o primeiro resultado tangível de um longo combate que temos travado ao longo dos últimos anos, e que foi tornado possível graças à persistência da presidência italiana da União Europeia (UE) e à nova abertura da Comissão de Jean-Claude Juncker.

De notar, no entanto, que este progresso em termos de flexibilização do PEC não representa a solução para todos os problemas, mas apenas um primeiro passo que terá de ser completado e concretizado na prática.

As medidas anunciadas pela Comissão garantem que os países que contribuírem financeiramente para o novo EFSI não terão as suas contribuições contabilizadas para efeitos de apuramento do défice orçamental no quadro do PEC, nem incorrerão no risco de sofrer as sanções previstas em caso de derrapagem persistente.

A mesma isenção será aplicada às contribuições públicas nacionais dos Estados para os projectos financiados pelo EFSI.

Ao invés, só os países com défices orçamentais inferiores a 3% do PIB é que poderão beneficiar de outro elemento de flexibilização do PEC assente na neutralização, para efeitos de apuramento do défice, do co-financiamento com dinheiro público nacional dos projectos apoiados pelo EFSI.

Isto significa que países que, como Portugal, têm ainda um défice orçamental superior a 3% do PIB, poderão, numa primeira fase, beneficiar sobretudo de um aumento do investimento na Europa que, graças a esta flexibilização do PEC, poderá abrir novos mercados para as exportações portuguesas.

Mas a flexibilização do PEC não se limita ao EFSI. A Comissão ao interpretar as regras actualmente existentes no PEC, decidiu que todos os países poderão beneficiar de uma suavização dos calendários fixados ao nível europeu para o ajustamento orçamental, desde que realizem reformas estruturais potenciadoras de crescimento económico.

Do mesmo modo, a trajectória de ajustamento que será pedida aos países com défices passará a ter em conta a situação económica de cada um. O que significa, em concreto, que nos países que enfrentarem uma recessão económica muito severa, não será exigido qualquer ajustamento. Nos casos de crescimento muito baixo inferior ao potencial, o ajustamento imposto será igualmente inferior ao que tem sido o caso até agora.

Se algumas das medidas de flexibilização já estivessem em aplicação há alguns anos, a recessão económica com que Portugal se debate há tanto tempo e todas as pesadas consequências sociais associadas poderiam ter sido menos graves.

 

 

 

Presidência italiana da UE abre uma luz de esperança para a Europa

Intervenção no debate do Parlamento Europeu sobre o semestre de presidência italiana do Conselho da União Europeia, com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, e com o Primeiro Ministro italiano Matteo Renzi

Senhor presidente Juncker, Senhor primeiro ministro Renzi

A presidência italiana será lembrada por uma série de iniciativas nomeadamente no que diz respeito ao fundo de resolução bancária ou ao branqueamento de capitais. Mas será sobretudo lembrada por ter tido a coragem e a inteligência de colocar na agenda politica algumas questões essenciais para a sobrevivência do euro e do projecto europeu.

A conciliação entre a disciplina das contas públicas e a sobrevivência da economia e do emprego, ou a necessidade de não matar o investimento estratégico só porque é preciso conter a despesa pública, podem parecer assuntos triviais e no entanto não o são. A presidência italiana trouxe estes temas seriamente como temas de discussão das políticas fundamentais da Europa.

A Comissão Europeia é nova, mudou, o Parlamento mudou. A Europa continua no entanto mergulhada na estagnação com riscos de deflação, com um desemprego assustador e com a perda de confiança dos cidadãos no projecto europeu. É verdade, a presidência italiana não trouxe ainda o choque de energia e de vitalidade de que a Europa necessita urgentemente, mas talvez isso fosse impossível.

Depois de anos de dogmatismo, e de austeridade cega e empobrecedora e sem esperança, a nova Comissão Juncker e a presidência italiana começaram a abrir os temas que interessam e a apontar na direcção certa. Nada fica concluído, mas abriram-se as portas para o trabalho que temos de fazer, certamente a nível de cada país, mas certamente também a nível colectivo, sobretudo agora que os limites e as lacunas da arquitectura europeia e sobretudo da moeda única se tornaram evidentes.

A reflexão tem de continuar. Faço votos para que a presidência letã não perca o momentum, mas faço votos também de que a Itália, uma vez no Conselho, não perca o rumo. A Europa precisa da Itália. Os cidadãos representados aqui nesta casa precisam de reencontrar a esperança e de reencontrar sobretudo a alma da Europa. Obrigada à presidência italiana, abre-se uma luz de esperança na nossa frente. Muito obrigada.

Monday 12 January 2015

Presidência italiana da UE quebrou 2 tabus: investimento e necessidade de conciliar a consolidação orçamental com o crescimento económico

Debate com o ministro italiano das finanças, Pier Carlo Padoan, sobre os seis meses de presidência italiana do Conselho de Ministros de Economia e Finanças da União Europeia - Comissão dos assuntos económicos e monetários do PE

Elisa Ferreira:

Muito obrigada, vou utilizar também a minha língua materna. Muitos parabéns pelo trabalho que foi feito pela presidência italiana, parabéns aos responsáveis que estão aqui hoje e parabéns a toda a equipa. Penso que houve um trabalho muito sério em condições muito difíceis e essas condições difíceis tiveram não só a ver com o facto de estarmos com novas instituições, uma nova Comissão, um novo Parlamento, mas também pelo facto de haver uma coincidência com um período muito prolongado de recessão e de desemprego que torna as decisões muito mais complexas.
Penso que a presidência italiana para além da lista de assuntos que já foram invocados quebrou dois tabus: um relativamente ao investimento e à necessidade de investimento, e outro relativamente à necessidade de reconciliar o equilíbrio das contas públicas com o crescimento económico.
Penso que se começou a dar passos nestes dois sentidos, mas a minha questão é: o trabalho não está acabado. Que peças faltam aqui para que de facto se consiga um choque positivo sobre a economia a tempo de evitarmos que toda a estrutura política e institucional europeia se desagregue?
Segunda questão relacionada com esta: está em curso uma discussão sobre uma visão mais a prazo, o relatório dos 4 presidentes, sobre o funcionamento da zona euro, que continua sem nenhuma capacidade anti-cíclica. O que é que nos pode antecipar da sua experiência sobre essa visão de futuro? Muito Obrigada.

Resposta de Pier Carlo Padoan:

Obrigada. Como já disse, são precisas duas variáveis para impulsionar, desencadear, o investimento: são precisas boas oportunidades de investimento e recursos financeiros.
Penso que o plano para o investimento que a Comissão está a apresentar tem um enorme potencial que precisa de ser usado da melhor forma. Isto, tanto em termos de mobilização de recursos financeiros para alavancagem, como também em termos de activação das oportunidades de investimento, e é aqui que vejo uma interacção positiva entre os programas de reformas nos Estados e este novo instrumento. Isto é particularmente verdade hoje em que, como lembrou, o investimento tem vindo a cair, e isto não é um fenómeno novo, tem vindo a cair desde há vários anos. Precisamos desesperadamente de investimento porque o investimento é a forma de traduzirmos oportunidades de investimento em crescimento. E isto pode ser feito tendo em mente tanto os programas nacionais como os programas europeus. Este é precisamente o espírito da nova iniciativa.
Deste ponto de vista, penso que devemos ligar de forma mais próxima - e isto é parte da operação através da qual este novo instrumento é criado - as oportunidades de investimento para aprofundar a integração. O mercado interno, que está incompleto é a grande reforma estrutural através da qual o investimento pode ser reforçado.
Precisamos por isso de perceber melhor qual é a relação entre as iniciativas do mercado interno e os programas nacionais de reforma. Isto tem possivelmente a ver com a visão de longo prazo que também mencionou.
A longo prazo acredito, e sou um grande convicto, de que a Europa poderá reforçar muito o seu potencial de crescimento com a eliminação das barreiras ainda existentes entre países, gerando uma dimensão europeia, por exemplo, em grandes infraestruturas, em capital imaterial, em capital tangível, em telecomunicações ou em inovação. Ainda podemos fazer muito para construir o que poderá ser referido como um espaço europeu de inovação.
Tudo isto exige medidas estruturais tanto ao nível europeu como nacional, e exige recursos que terão de ser direccionados, utilizados e mobilizados. Este é o momento certo para o fazer. Este é o momento para ligar os novos instrumentos financeiros às oportunidades de investimento e fazê-lo em cooperação. Por último, também temos a oportunidade de perceber melhor como é que os programas nacionais de reforma podem ter efeitos positivos nos países vizinhos e completar assim a dimensão europeia.