Isto é a Europa?
A segunda verdade, e que as instituições europeias não conseguem admitir, é que, se a dívida grega se tornou uma bola de neve imparável, foi em grande parte devido ao falhanço total da agenda de austeridade.
Como diz o conhecido economista americano, Barry
Eichengreen "os credores calcularam de início o excedente primário
necessário ao reembolso da dívida" e "a seguir forçaram o país a
esmagar despesas e a cobrar impostos de modo a obter esses excedentes". Ou
seja, os credores "ignoraram o facto de que, ao fazê-lo, condenaram o país
a uma depressão ainda mais profunda", na qual, acrescento eu, a dívida e o
empobrecimento florescem de braço dado. Podem os cidadãos sufragar uma agenda
que cada dia os arruína e endivida mais?
A terceira verdade, é que, nesta semana, se tornou
evidente que a TINA (there is no
alternative) em matéria económica está rapidamente a degenerar numa TINA
partidária. Esta agenda indisfarçável começa na pressão da CDU sobre Merkel, é
propagandeada pelo Eurogrupo e pelo seu presidente, Jeron Dijsselbloem, e
termina numa "campanha europeia" que inclui ameaças explícitas ou
implícitas de que um "não" no referendo obrigará a Grécia a sair do
euro. Na prática, afirmações destas implicam que, se os gregos disserem
"sim" à estranha pergunta do referendo, estarão a votar uma moção de
rejeição do governo Syriza e a repor um governo alternativo. Governo este que
praticamente só poderá ser constituído em torno do maior partido que resta - ND
- irmão da CDU alemã, embora eventualmente com uma coligação que não será mais
do que simbólica com o que hoje resta dos socialistas gregos (Pasok e To Potami).
Pelo caminho, tal como o Financial Times reconhece, vai um presentinho para
Mariano Rajoy, ameaçado pela popularidade do Podemos.
3. Qual o papel dos socialistas europeus no meio
deste cenário? A esquerda moderada europeia está hoje a sofrer as consequências
da sua opção (ou incapacidade) de se distanciar política e ideologicamente, a
nível europeu, da agenda austeritária dominante imposta desde 2010 pelos
conservadores. O debate intenso dentro do grupo político europeu - S&D - nunca
conseguiu gerar uma posição comum clara e percetível pelos cidadãos enquanto
discurso claramente alternativo. A clivagem Norte-Sul sente-se também aí.
Não, os socialistas não estão todos ao lado de
Merkel. Ao contrário do que alguma imprensa portuguesa parece fazer crer -
"François Hollande alinha-se com Merkel sobre a Grécia", Expresso de
2/7/2015 - a imprensa europeia confirma de forma clara a existência de fortes
tensões entre Hollande e Merkel a propósito da crise grega. Durante todo este
lamentável processo negocial, os socialistas franceses, italianos, portugueses
e alguns alemães estiveram ativamente por trás das peças construtivas das
negociações. A verdade, todavia, é que todo este trabalho de conciliação e
moderação da agenda, incluindo o do presidente do Parlamento Europeu, Martin
Schulz, fica comprometido com declarações públicas, algumas duríssimas, de
responsáveis socialistas, nomeadamente de Sigmar Gabriel, líder do SPD alemão, Dijsselbloem
- e, infelizmente também, após a rotura das negociações, de Schulz - que não
permitem distinguir a agenda socialista da conservadora.
Deste apagamento público dos socialistas europeus
enquanto alternativa consistente à TINA no quadro da União Europeia, resultam
duas conclusões: por um lado, há um risco muitíssimo sério de que cada vez mais
cidadãos europeus procurem respostas em opções partidárias e ideológicas radicais de esquerda e de direita, fora
do quadro pró europeu, para a frustração,
desespero e ausência de futuro resultantes da austeridade.
Mais
preocupante do que o Syriza e o alegado radicalismo de esquerda na Grécia é o
grupo de Marine Le Pen (líder da extrema-direita francesa) que acaba de ser
formalmente constituído no Parlamento Europeu, e cuja ideologia é largamente
alimentada pela "vacina" imposta a Atenas.
Uma segunda conclusão é que cada vez mais é evidente
que, hoje mais do que nunca, a estratégia política que António Costa tem vindo
a seguir é mais do que correta e fundamental e tem de ser apoiada. Cabe aos
socialistas demonstrar que há alternativa à TINA e à terrível agenda recessiva,
dentro da União e não fora dela, antes que seja demasiado tarde.
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