Estas revelações, que tudo indica vão continuar nos próximos dias, não
surpreendem nem pelos esquemas utilizados nem pelo papel preponderante dos paraísos
fiscais na atracção de capitais ilícitos. Estas práticas têm vindo a ser
amplamente reveladas graças à acção corajosa de lançadores de alerta e de
centenas de jornalistas de investigação, como aconteceu nomeadamente nos casos
LuxLeaks, SwissLeaks ou OffshoreLeaks.
O que é absolutamente escandaloso neste caso é a escala astronómica dos esquemas
revelados que, recorde-se, se referem a uma única empresa de um único país envolvendo
milhares de nomes de pessoas individuais e empresas, entre as quais largas
dezenas com grandes responsabilidades nos mais variados sectores, em mais de
200 países ou territórios.
Se dúvidas houvesse, estas revelações provam a reduzida eficácia dos
mecanismos de cooperação entre Estados que têm vindo a ser instituídos nos
últimos anos pela UE, OCDE e G20 no combate à fraude e evasão fiscal: apesar de
louváveis, os acordos internacionais e as promessas de troca de informações
entre administrações fiscais ou de fim do segredo bancário não só são frouxos, como
têm vindo a diluir-se devido a obstáculos vários, acabando o resultado final
por se distanciar progressivamente dos objectivos pretendidos.
Também na UE, apesar dos progressos conseguidos recentemente em termos de
legislação comunitária contra a fraude e evasão fiscal - graças em grande parte
à pressão do Parlamento Europeu e à acção pouco usual da Comissão Europeia na
apresentação de propostas legislativas sob a responsabilidade do comissário
Pierre Moscovici - os Governos continuam a abordar esta questão de uma forma
excessivamente tímida, recusando ir além dos standards internacionais e pouco ambiciosos da OCDE. Os Governos da
UE também continuam a escudar-se nas reduzidas competências comunitárias nesta
área para travar muitos dos avanços indispensáveis para quebrar a opacidade que
permite a proliferação dos mais variados esquemas de fraude e evasão fiscal.
Uma das medidas que terá de ser tomada com urgência é tornar os paraísos
fiscais ilegais e introduzir sanções para pessoas e entidades que operem com
eles. Para isso, no entanto, a UE e a OCDE têm de clarificar rapidamente o
conceito de paraíso fiscal.
Recorde-se, a propósito, que na falta de critérios firmes e estáveis sobre
este conceito, e apenas em reacção aos compromissos assumidos em termos de
transparência e troca de informações - não cumpridos, como se vê agora - o
Panamá saiu há muito da lista de "jurisdições não cooperantes" da
OCDE. Na UE, só 8 países - incluindo Portugal - mantém esta classificação.
A gravidade das revelações dos Panama Papers é tal que é impossível que os responsáveis
políticos não reajam com firmeza, eliminando os obstáculos políticos que têm
vindo a impedir uma acção mais decidida nesta matéria.
A UE tem de assumir a liderança deste combate como tem sido repetidamente
pedido pelo PE, incluindo no relatório TAXE, de que fui co-relatora, e que
resultou de um ano de investigações sobre os acordos fiscais preferenciais
concedidos por vários países a multinacionais para lhes permitir, precisamente,
reduzir ao mínimo ou mesmo eliminar os impostos que pagam obre os lucros, com
frequente recurso a paraísos fiscais.
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