Este processo deixa-me um sentimento misto de dúvida e de esperança.
O benefício da dúvida que o grupo socialista deu a Juncker, eleito pelo PE em Julho, foi baseado numa promessa de inversão da agenda da austeridade. A credibilidade dessa promessa do novo presidente está agora dependente dos comissários a quem atribuiu responsabilidades nas áreas económicas e sociais e que terão de executar os compromissos assumidos.
Percebe-se agora que, quando confrontou o PE com uma distribuição de pelouros entre os seus 27 comissários, Juncker já a tinha pré-negociado com os líderes das principais famílias políticas europeias. A nova estrutura inclui um primeiro vice-presidente socialista - Frans Timmermans - com competências gerais e horizontais sobre toda a Comissão, dois vice-presidentes coordenadores das áreas económicas conhecidos pelas suas convicções pró-austeridade - Jyrki Katainen e Valdis Dombrovskis - e um comissário socialista encarregado da governação económica - Pierre Moscovici. Com esta composição ancorada num acordo político, Juncker jogou forte colocando o PE numa situação de "pegar ou largar", ou seja, aceitar ou rejeitar tudo em bloco.
Este pacote, no qual muitos socialistas não se revêem, decorre todavia, em última instância, do facto de ter sido a direita a vencedora das eleições europeias de maio.
Mesmo assim, batemo-nos pela introdução de alterações. O resultado mais visível serão talvez os compromissos assumidos por Dombrovskis - que vai coordenar a acção de Moscovici - durante a audição no PE, que só não arrepiaram os cabelos da direita por ser um dos seus membros. Cito, a título de exemplo, a convicção que manifestou de que "globalmente, a UE já concluiu o ajustamento orçamental" e que a agenda económica precisa agora de se "concentrar no lado da procura, incluindo com o aumento de salários (...), alteração da fiscalidade, transferência da fiscalidade do trabalho - sobretudo do trabalho pouco remunerado- para o capital, para a propriedade, para taxas ambientais e para outras áreas menos prejudiciais para o emprego".
O maior problema desta equipa é Katainen, o finlandês bem conhecido pelas más razões nos Estados membros do sul, agora responsável por coordenar a promessa central de Juncker de mobilização de um pacote de investimentos, incluindo públicos, de 300 mil milhões de euros. Katainen não avançou qualquer resposta satisfatória sobre as inúmeras questões que lhe foram colocadas na matéria nem deu sinais de recuo na sua saga pela austeridade, o que deixa a credibilidade do próprio Juncker nas suas mãos.
Até à votação final do colégio de comissários pelo PE, a 22 de Outubro, haverá que ponderar até que ponto o voto de confiança dado a Juncker em Julho merece ser confirmado. Só então se tornará claro se será possível confiar na nova Comissão Europeia e na sua abertura para operar a viragem da agenda económica com que se comprometeu.
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