Juncker conseguiu que o grupo S&D lhe desse o benefício da dúvida graças aos compromissos políticos de mudança da agenda europeia assumidos por si e pela sua equipa.
Não tendo a esquerda moderada e pró-europeísta saído vencedora das eleições europeias, a verdade é que dificilmente se poderia encontrar um perfil, nas hostes da direita, mais adequado para liderar a Comissão nesta época dificílima do que o de Juncker, pelas suas convicções humanistas, características pessoais e experiência.
Os perfis de alguns comissários e a inadequada distribuição de alguns pelouros entre eles continuam, no entanto, a levantar-nos sérias dúvidas. Durante o debate entre o presidente eleito e o PE esperámos introduzir mais alterações na repartição de responsabilidades entre os membros da nova Comissão do que aquela que acabou por resultar na versão final.
Mesmo assim, houve que ponderar as consequências de um voto crítico, fosse ele negativo ou indefinido, como seria o caso de uma abstenção. Essa eventualidade provocaria, na prática, uma fragilização desta Comissão e do seu presidente face ao todo poderoso Conselho de Ministros da UE e em particular face àqueles Governos europeus – leia-se sobretudo o alemão – que o têm dominado nos últimos tempos.
Este voto positivo não pode, no entanto, significar um cheque em branco. Muito pelo contrário: o benefício da dúvida que foi dado à Comissão tem de ser acompanhado de uma exigência e vigilância constantes e reforçadas sobre o rigor com que Juncker honrará os compromissos assumidos.
A agenda europeia tem de mudar e mudar já, e foi com essa mudança que Juncker se comprometeu perante o PE.
Para mudar, é preciso alterar imediatamente a agenda da austeridade - em grande medida ideológica - dos últimos seis anos que já foi longe demais e cujos resultados desastrosos são hoje evidentes: uma política de austeridade assumida de forma sincronizada por economias tão interligadas como as europeias gerou a espiral de recessão económica que hoje é evidente no desemprego galopante – quase 25 milhões de europeus estão sem trabalho –, nos fenómenos novos da deflação e estagnação económica (apesar de as taxas de juro do BCE estarem próximas de zero) e nas divergências económicas e sociais brutais tanto entre o centro e a periferia como no interior dos países mais fragilizados. Com a agravante de que o excesso de dívida entretanto acumulada pelas economias mais frágeis durante o processo de ajustamento começa a despertar os ataques especulativos de operadores financeiros internacionais que as decisões de Draghi no Verão de 2012 pareciam ter neutralizado.
Neste momento, se a agenda não mudar com urgência, é a sobrevivência do euro e mesmo do projecto europeu que está em risco.
A promessa mais óbvia e imediata de Juncker para estimular a economia – um programa de investimento de 300 mil milhões de euros em três anos – vai ser o primeiro grande teste à credibilidade da nova Comissão.
Hoje, depois de todos os debates e audições aos novos comissários, continua a não ser claro como é que este pacote se vai concretizar, nem de onde virá o dinheiro.
Acredito que Juncker tem plena consciência da urgência da mudança, mas a verdade é que a Comissão Europeia não tem sozinha os meios para a concretizar. O que significa que ou entramos numa nova fase e a Comissão, o PE e, acima de tudo, o Conselho – a começar pela Alemanha – se sentam à mesma mesa e chegam a acordo sobre o diagnóstico e a forma de resolver o problema, ou a Europa ficará rapidamente em muito maus lençóis.
Temos as soluções e os meios para resolver o problema, o que falta é sobretudo a vontade política de trabalhar para o bem-estar de TODOS os cidadãos e, em última análise, salvar o projecto europeu.
Veremos se o novo presidente da Comissão saberá estar à altura da gravidade do momento.